Pato a Tuiuti
- Thomas Kehl
- 12 de fev. de 2018
- 2 min de leitura
Você pode gostar ou não do carnaval, mas não acho estranho que o carnaval seja a própria representação da atualidade no Brasil. O carnaval é uma festa a fantasia, concebida para ser "a inversão dos pecados"; e diz muito de nós, brasileiros, que gostamos das máscaras da alegria para apaziguar nossas vergonhas e desgostos.
Então, como que em pleno carnaval, aonde se espera exuberância, sorrisos e alegrias, uma escola como O Paraíso do Tuiuti, com o tema do enredo "Meu Deus, Meu Deus, Está Extinta a Escravidão?" (11/02/2018) consegue mostrar algo que nos mexe, não pelo belo, mas pela realidade crua que expressa?
E digo que é preciso uma genialidade ímpar, para transformar essa máscara naquilo que tanto tentamos esconder, sendo isso que o Grêmio Recreativo da escola de Samba da Tuiuti fez nesse domingo, usou toda força da arte transgressora, para gritar a dor de um passado e um presente de humilhação e impotência. De pessoas que foram subjugadas e perderam e ainda perdem seus direitos e potências.
Não adianta esconder, o Brasil se fundamentou na escravidão, no abuso de poder e nos benefícios por interesse. E essas marcas perpassam nossos dias até hoje; preconceitos (mascarados ou não), corrupção, e até o famoso "jeitinho" são reflexos disso. O que a Tuiuti teve, foi a coragem de expor com tamanha clareza tudo isso. Eles nos fizeram olhar para nossa história, não como um passado distante, mas como um passado que nos atravessa, e que se repete diariamente através do sofrimento e da humilhação.
E é com uma apresentação assim que a arte toma forma, pois ela não serve a moldes ou prescrições. A arte não existe para exaltar o belo; a potência dela é quando brota do improvável para abrir nossos corações para as incoerências e absurdos do nosso cotidiano.
